"O Xangô de Baker Street", por Jô Soares
A primeira impressão é bastante favorável. O autor é um
humorista inteligente e seu livro é uma anedota contada com graça e leveza.
Mais: Jô Soares demonstrou bom-gosto na escolha do cenário, ao optar pelo Rio
de Janeiro do século XIX como ambiente para a sua trama – quase que uma
avant-garde do que Woody Allen
faria tantos anos depois, com seu saboroso “Meia-Noite em Paris”. Jô é um
craque do texto fácil.
Espirituoso. Ostenta uma
erudição minimalista. É leitor perspicaz e domina a técnica da escrita sem
solavancos – não à toa o sucesso do título. Sua pesquisa sobre fatos e
personagens desse Rio histórico oferece um texto de leve massa folhada, que se assemelha a
sketches de programas de humor, tal o seu timing. E as piadas são a
espinha-dorsal desse simulacro de romance policial, onde o contraponto étnico
proporcionado pela dupla de ingleses às voltas com a quente, sensual e
apimentada capital dos trópicos oferece um inacabável estoque de gracejos. Aí vem a reviravolta, para a minha paciência e para minha boa vontade: o problema é que disso, infelizmente, o livro não passa, aí se nos revelando a
fragilidade da obra, que tem por apoio uma dúzia de anedotas, pouco além do razoáveis. Tirando os
parangolés históricos e as boutades que dominam os diálogos e circunstâncias,
sobra um caldo ralo e insosso. O desenrolar frustra o leitor, que se deixou
convencer pela promessa aparente de um livro denso e estruturado (como eu). Já a partir dos primeiros
capítulos - depois percebi - o enredo se dá em dutos
paralelos que nunca se encontram: a descrição esterotipada feita pelo autor dos
gestos e pensamentos do criminoso e o roteiro de descompromissada comédia de
costumes que avança a cada mudança de cenário. O bom livro de suspense provoca
o leitor para que decifre o enigma; nesse livro do Jô o leitor descobre que o mistério era
uma troça. Quem lê, que faça as suas concessões, porque eu não as faço. No fim das contas, é um bestseller – e, consinto, só isso já reverencia o talento do autor. Ocorre, porém, que, em geral, os
bestsellers são má literatura. Não
estamos diante de uma exceção.
Companhia das Letras, 344 páginas
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