"Jogo Sujo", por Andrew Jennings
Foi um período confuso. Li esse livro ao mesmo tempo em que
mergulhava na obra do jornalista José Nêumanne sobre o sindicalista Lula e enquanto lia nos
jornais as peças de oratória dos advogados dos réus do mensalão. Não é pouca
coisa. Não sabia mais se mequetrefe era o prefeito do PT ou o presidente da
Federação de Futebol da Jamaica - é que lá e cá o couro come. Andrew Jennings, o
autor, parece o tal zagueiro-zagueiro:
desce a borduna. Porque Jennings é um denuncista. Ele apura e denuncia.
Joseph Blatter, presidente da FIFA, o odeia. A FIFA proibiu-o de assistir às
coletivas de imprensa e de estar presente nos eventos promovidos pela entidade. Não é à toa. Jennings
relata o antro sórdido de corrupção miliardária que é a organização, criminosa.
O autor não poupa nada, nem ninguém. Até os brasileiros entram de roldão - no
livro, João Havelange e Ricardo Teixeira são alguns dos protagonistas, bem remunerados, da
escala de distribuição polpuda de dinheiro empreendida pela ISL em sua parceria
com a FIFA. A TV Globo também está no bolo (o que demonstra que as chances das
denúncias de Jennings ganharem repercussão na Vênus Platinada foram, são e
serão próximas de zero). Quem quer ver o detalhamento da gigantesca teia de
corrupção que é a FIFA pode seguir na obra o passo-a-passo da compra de votos,
das negociatas para transmissão e patrocínios dos eventos, dos ingressos de
cortesia vendidos no câmbio negro, dos gordos mensalões pagos a cada federação
inexpressiva - e se deleitar. Das armações fajutas no Caribe às transações pelo direito de sediar as Copas, o texto é um prontuário. Jennings é um esteta do cinismo. Pena que ele,
porém, restrito às suas poucas armas – denúncia e sarcasmo -, é impotente para
ir além disso. É um cão que late, mas que tem poucas oportunidades de cravar seus dentes em carne macia; raivoso, sua maior dentada foi o livro. “Vou escrever
um livro sobre esses mal-feitos”, deve ter pensado. Ou ameaçado. Foi em frente e escreveu. Me coube
comprar e ler. É o mínimo que posso fazer pelo seu tenaz esforço investigativo. Mas não escondo
de ninguém: se, como denúncia, seu trabalho é impressionante, como livro é maçante. Ossos do ofício. A literatura é ingrata.
Panda Books, 351 páginas
0 comentários: