"Honra teu pai", por Gay Talese
Coerentemente com suas tradições familiares (o pai foi alfaiate), Gay Talese tem texto bem medido. A métrica existe em função da clareza e o pano – elegante linho 120s – é bem cortado. O então jovem jornalista Talese entra dentro da história do seu biografado, chuta para o alto pudores de envolvimento (e se envolve) e tenta se manter imparcial (não consegue) para contar a história do herdeiro de um império mafioso que colecionou tentativas, arremedos e frustrações. Não é o que se espera de um livro cuja pretensão é contar a “verdadeira história da Máfia, por dentro”. Temos na obra muitos conflitos familiares e poucos tiros. Muitas surpresas, poucos clichês -mas um excepcional livro, cerzido ponto a ponto. Gay (que é brilhantemente resenhado em um posfácio assinado por Pete Hamill) nos convida a conhecer Bill Bonanno, um mafioso sem grandes crimes para contar, cuja liderança (imposta à bandidagem pelo pai ao qual sempre quis honrar) foi rejeitada. Por intermédio de Bonanno, Talese nos apresenta um painel da grande Máfia, desde suas remotas origens sicilianas (o que nos permite saber que a máfia americana nada mais foi do que o transplante de uma guerra de clãs da longínqua Castellamare para os bairros de imigrantes italianos em Nova York) até seu esfacelamento, afogada por novos grupos étnicos que assumiram a liderança criminosa. Nos diverte o conservadorismo de foras-da-lei que reverenciam a lei. Não podia durar muito, mesmo. Ficou a lenda.
Companhia das Letras, 510 pgs
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