Roth tem inegável domínio das palavras. Passeia por Berlim e aponta vícios, jardins, ladrões, proxenetas, políticos. Se espanta com o trânsito e com a invenção perniciosa dos semáforos. Descreve com pertencimento e estranheza a metrópole que o engole e cospe, autor que registra seus ângulos - mas não é capaz de acompanhar e apreciar suas alterações. A gigante em mutação é descrita, conhecida em sua generosidade, mas incompreendida em sua maldade. É uma relação ambígua, de paixão devotada – mas ferida pela ausência de reciprocidade, justo a ele, autor e habitante, que tão melhor a percebe. Maior relevância tem o texto final, em que ele assume seu judaísmo e protesta, já da França, contra o nazismo triunfante e que se apropria da Alemanha. Exalta o escritor judeu alemão como o cronista da Alemanha urbana. E não tem dúvidas quanto ao horror que representará a chegada de Hitler ao poder e antevê o que se dará. Porém, até mesmo que se ombreasse aos mais perspicazes “antecipadores” do período de trevas, citando o futuro extermínio dos judeus, pouco provável que ele conseguisse imaginar o método com que isso se daria. Melhor para ele.

Companhia das Letras , 206 pgs