"De Pedro I a Luiz Inácio Lula da Silva"

quinta-feira, janeiro 25, 2018 Sidney Puterman

O subtítulo da edição que celebrava os 180 anos do Jornal do Commercio, em 2007, se tornou, com o tempo, mais representativo do que o próprio título, "180 anos do Jornal do Commercio". O diário econômico, com quem eu tive a satisfação de trabalhar por mais de uma década, logo depois soçobrou. Afundou, desapareceu. As carcaças dos grandes naufrágios costumam ser perseguidas e valem seu peso em ouro. Não é o caso deste esquecido transatlântico. Por isso, o estapafúrdio e subserviente subtítulo tem bem mais peso do que seu conteúdo, que agora se destina à antropologia do jornalismo. O JC não está mais entre os vivos. De D. Pedro I a Lula? O imperador, premido aqui pelos políticos, largou o osso e foi fazer a guerra em Portugal, sua terra natal. Lá virou D. Pedro IV, o Rei Soldado, e morreu jovem e doente. E Lula? Que destino complementaria sua biografia? Hoje, 25 de janeiro, dia seguinte à condenação unânime em segunda instância pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o país, qual barata tonta - ou mera criança enganada pelas mãos de um mágico aprendiz -, olha para o lado errado e discute as questões erradas. A polêmica sobre a prisão de Lula é irrelevante para a sociedade real. O que nos é relevante são as regras sociais, as leis e o cumprimento delas. O ponto de partida para o progresso coletivo é a sociedade organizada; o ponto de chegada são as projeções de longo prazo, determinando o que é necessário hoje para atingirmos o que queremos amanhã. Tudo o mais é bobajada. O problema é que nós só nos dedicamos à bobajada. O político corrupto não pode ser sempre o assunto atual - pois, ao se revelar corrupto, o bom senso exige que sua carreira pública seja encerrada. Ele deve migrar da página política para a página policial, permanecendo no âmbito político os que ainda não têm mácula. Pela preservação da sua saúde, a sociedade não poderia confiar a gestão dos recursos coletivos a um corrupto notório. Assim, se o eleitor tivesse discernimento, jamais cogitaria dar seu voto a um político acusado de corrupção. Como não contrataria para a festa de debutante da sua filha um segurança acusado de se embebedar no serviço. E que jamais matricularia sua filha de quatro anos em uma creche cujo dono é acusado de pedofilia. São premissas simples e que prescindem de debate. Este raciocínio primário deveria ser transportado para a região do hemisfério cerebral onde se aloja a opinião política. Rume o eleitor para este patamar mais lógico e os candidatos, sem alternativa, obviamente se refinarão. Os eleitos terão condutas mais adequadas e a gestão será mais eficaz. Os corruptos se tornarão exceção e não a regra. Mas o que ocorre é que a opção do eleitor, seja lá porque razão, é a passionalidade. O eleitor estimula a ladainha, a chorumela, a enganação. Se apaixona. Torce. Defende até as vísceras políticos sem caráter flagrados com dinheiro na cueca, na mala, no táxi, embaixo do colchão, em apartamentos-cofre, no táxi-aéreo, no gabinete, na mesa do primo que ele pode "mandar matar" (políticos banais que, no fim das contas, não são candidatos a santo, gênio ou salvador da pátria, são apenas os eleitos para gerir o dinheiro coletivo que estão escancaradamente roubando). Reitero que este mesmo eleitor não defenderia seguranças acusados de se embebedar no serviço, nem donos de creche acusados de estuprar criancinhas. Hoje perdemos tempo com os duzentos cenários possíveis para que um político condenado por corrupção em segunda instância consiga, ou não, evitar a cadeia e permanecer influente. Sinceramente, não deveria nos interessar. Políticos acusados de corrupção, mesmo os mais populares e poderosos - listo aqui Cabral, Temer, Lula, Aécio, Maluf, Renan, Dirceu, Cunha, Dilma, Palocci, Sarney, Pimentel, Collor, Barbalho, Agnelo, Moreira, Geddel e outros dez mil -, devem ser tratados como o que são: donos de creche acusados de estuprar criancinhas. Merecem repúdio, asco e aversão. Têm que se tornar, a priori, carta fora do baralho. Descartá-los é o mínimo. Que enfrentem seus processos. A questão criminal não interessa à sociedade. Em política, nos interessa a gestão dos recursos coletivos e as políticas de médio e longo prazo a manter e a reformular. Não me convém o político cujo discurso seja o de "mudar tudo", pois eu já sei, de antemão, que ele não vai mudar nada. Este "prometedor de palanque" ou é ingênuo ou age de má fé. Fora com ele. Não se muda nem um botequim em um dia, não será uma cidade, estado ou país que ele irá mudar em quatro anos. Respostas aos anseios populares e projetos para questões básicas têm que ser apresentados com uma antecedência digerível, não pode ser a 60 dias da eleição. Nem é necessário horário político: com a internet, cada um que publique a sua plataforma no início do ano. Sabatinas públicas exporão as convicções dos candidatos sobre os planos propostos e deixarão claras as artificialidades e incongruências. Mas quem primeiro precisa se preparar é o eleitor. Ele, o eleitor, analisa e escolhe. O político é uma consequência da nossa capacidade de analisar e escolher. O resto é estorinha.

Sidney Puterman

Some say he’s half man half fish, others say he’s more of a seventy/thirty split. Either way he’s a fishy bastard.

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