"Breve história de quase tudo", por Bill Bryson

sexta-feira, maio 07, 2021 Sidney Puterman


Gosto do Bill. Escreve fácil e sobre tudo. Bem, quase tudo. Esse livro se propõe literalmente a isso. Vai direto ao ponto (alguns milhares deles) e, portanto, não sou eu quem vai enrolar (nem tampouco falar de 0,1% do inenarrável volume de temas enfileirados pelo nosso bom Bill). Então, para poupar o meu e o seu tempo, vamos à obra. Começa com a mais clássica de todas as perguntas: "De onde viemos?" e taca-lhe big-bang. São umas dezenas de divertidas páginas sobre astronomia. Mesmo divertidas, são sobre astronomia. Depois entramos no terreno das medições, ainda que o terreno permaneça galático. Vamos para Halley, Newton e a curva elipse dos planetas. Para como certos sujeitos viajavam para um lugarejo na Escócia, ficavam lá quatro meses e saiam da temporada com a massa da Terra definida (Henry Cavendish fez isso em 1797, onde chegou à conclusão, usando a trigonometria e a massa dos montes locais, de que o planeta pesava 6 bilhões de trilhões de toneladas métricas - e, pasme, com a tecnologia que dispomos hoje, 300 anos depois, reajustamos o cálculo para 5,97 bilhões de trilhões de toneladas métricas, ou seja, menos de 1% de diferença). O próximo e movimentado capítulo é a descoberta dos fósseis e dos dinossauros. Isto inclui uma curta biografia do canalha desonesto que batizou os bichos como dino + saurio, ou seja, lagarto terrível, ainda que os dinos não fossem lagartos. Mas isso não tem a ver com sua canalhice ou desonestidade, que consistia basicamente em roubar descobertas científicas dos demais colegas, enquanto olimpicamente se dedicava a arruinar a reputação alheia. O tal, Richard Owen, acabou estátua no Museu de História Natural, permanecendo, veja só, em lugar mais proeminente do que a estátua de Charles Darwin no mesmo local. Mantell, o verdadeiro descobridor de grande parte das descobertas que Owen reivindicou para si, se suicidou pobre, abandonado e aleijado, devido a um acidente de carruagem. Sua coluna retorcida acabou exposta no museu pelo próprio Owen, e só saiu da exibição pública após uma bomba alemã explodir o edifício, na Segunda Guerra Mundial. Vale dizer de bom sobre Owen que foi ele quem impôs o conceito de museu como um local público, aberto a todos e para visitação sem restrições do acervo acumulado. Quem diria, ehm? Merece uma linha também mencionarmos os paleontólogos norte-americanos Cape e Marsh, rivais por toda a vida, que elevaram de 9 para 152 o número de dinossauros diferentes desenterrados e classificados nos Estados Unidos. Quando o tópico passa a ser a química e a alquimia, há um curto espaço dedicado à impressionante (e bizarra, na minha opinião) vida do Conde de Rumford, que nasceu o plebeu Benjamin Thompson no interior dos EUA, em 1853. Aos dezenove anos, Thompson casou com uma viúva rica catorze anos mais velha, com quem teve um filho, mas, por ter apoiado o lado errado na Guerra da Independência, em seguida abandonou a ambos e fugiu para a Europa, onde acabou conselheiro militar da Baviera - cargo que ocupou com tal sucesso que foi nomeado conde de Rumford do Sacro Império Romano. Arrumou um tempinho para se tornar a maior autoridade mundial em termodinâmica e o primeiro sujeito a elucidar a circulação das correntes oceânicas (lembrando que na Baviera não tem praia). Inventou a cafeteira, a roupa íntima térmica e um tipo de fogão que até hoje é conhecido como fogão de Rumford. Mais? Fundou em Londres a Royal Institution, de suma importância no desenvolvimento da ciência da época. Com todo este sucesso acumulado, o conde foi para a França e faturou mais uma viúva, desta vez a do célebre Antoine Laurent Lavoisier. Esta eu aposto que você não sabia. O impagável (força de expressão, está por razoáveis R$ 59,90 na Amazon) livro de Bryson segue nesta toada e vai nos apresentando dezenas de cidadãos brilhantes dos mais variados séculos e países (não, não há nenhum brasileiro entre eles), que descobriram (quase) tudo que havia para descobrir e que foram determinantes para estarmos aqui, agora, eu e você, cada um de um lado desta telinha fosforecente. A química, o miolo da terra, Einstein, o que existe no espaço, o fundo do mar, o universo microscópico, o darwinismo, o clima da Terra, o macaco e o seu sucessor (nós). Bill nos leva para uma irresistível viagem pelo desmonte da ignorância humana. O título faz jus ao que o leitor encontra no miolo. A narrativa é uma provocante história do conteúdo teórico e científico que a nossa espécie foi capaz de organizar. Se os temas são via de regra complexos, o bem-humorado texto de Bryson facilita à beça. Nós, ignorantes, "escutamos", sem nos enfadar, a breve história de praticamente quase tudo. Se você é curioso como eu sou, é um prato cheio. Pode até ser que você leia nele uma tonelada e não retenha sequer cinquenta gramas, mas vai rir à beça com a esplêndida e inusitada escalada humana rumo ao conhecimento - que, dizem, não ocupa espaço. Bem, no caso, módicas 541 páginas.

Companhia das Letras, 541 páginas, como eu acabei de dizer

Sidney Puterman

Some say he’s half man half fish, others say he’s more of a seventy/thirty split. Either way he’s a fishy bastard.

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