"Dirceu", por Otávio Cabral

sexta-feira, julho 19, 2013 Sidney Puterman

Era um domingo e baixou na minha caixa de correio o mail marketing da livraria: o lançamento da biografia do ex-ministro José Dirceu. Não levei fé que prestasse. Pensei que era uma “autorizada” e deixei pra lá. Logo em seguida, porém, li (já não lembro onde) que um dos editores da Veja havia escrito a tal biografia, com base em alentadas pesquisas e depoimentos diversos. Ora, se vinha da Veja, era pau puro. Não que isso fosse necessariamente bom – o ideal é um texto isento - , mas já afastava a idéia dessas bios de araque, que se restringem a peças promocionais, contratadas pelo biografado na vã tentativa de suturar imagens arrombadas. Isso posto, fiz a compra e ainda levei um desconto de nove reais. Bom negócio. O livro conta um pouco desse misterioso personagem da política brasileira. Relata sua infância na cidade natal, sua chegada a São Paulo e acompanha sua meteórica trajetória como líder estudantil (inevitável o paralelo entre a resistência universitária à época e os atuais protestos - mas são momentos distintos e mundos desiguais). Do caos de então, o já enigmático Zé Dirceu foi catapultado para o primeiro plano do conturbado cenário nacional;  ao integrar o ecumênico grupo de 15 presos políticos a serem embarcados no Hércules 56, em troca do embaixador americano sequestrado, o biografado pulou divisões e se instalou no andar de cima do prédio oposicionista ao governo militar. Esse momento de transição funcional na resistência armada ao regime - e de status entre seus pares - e os onze anos que se passam entre sua chegada à Cuba e sua contribuição à fundação do PT são os mais interessantes do livro, que, na verdade, é bem escrito, no andamento característico dos textos da Veja (parece até mesmo uma edição da revista, só que com menos fotos e sem as matérias idiotas). A partir daí temos um resumão do muito que já foi publicado em inúmeros jornais e livros – da sua chegada ao poder até a Ação Penal 471, o Mensalão -, com avareza de fatos novos. A estratégia do autor é descer a lenha no biografado, o que ele faz, sem dó. Se tudo o que é descrito procede? Provavelmente, sim. Dois ou três fatos que pudessem ser refutados desqualificariam a obra e, por conseguinte, toda a peça de acusação e júbilo editorial que a caracteriza. O experiente político não se pronunciou – matreiro, sabe que um mínimo gesto de protesto seria a melhor estratégia promocional para o livro, que decuplicaria sua venda e exposição. Assim, por não ter lá essa enxurrada de revelações e não ter sido contestada, a biografia de Zé Dirceu segue em rio de águas calmas, quase indiferente ao mundo que a cerca.

Record, 343 páginas

Sidney Puterman

Some say he’s half man half fish, others say he’s more of a seventy/thirty split. Either way he’s a fishy bastard.

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