"Fábulas completas", por Esopo

quinta-feira, julho 14, 2016 Sidney Puterman

Fábulas são legais. É algo que todo mundo gosta, mesmo sem conhecer bem. São curtas, têm bichos e dão umas lições de moral bacanas. A gente até pensa que a maioria delas é apócrifa ou de domínio público. Mas não: em alguns casos, têm até assinatura de grife, como as de Esopo, autor fecundo da Grécia antiga e até hoje editado. Em alguns casos, com certo luxo. Para sorte do autor (não a do meu bolso), foi o que aconteceu com o exemplar que eu adquiri. Minutos antes de penderar as chuteiras, a saudosa CosacNaify imprimiu Esopo em formato compacto, com capa acamurçada (e com ilustrações instigantes - e incomodosas - de Eduardo Berliner). Uma bela publicação. As fábulas são, algumas, divertidas, e, outras, bem insossas. A moral de cada estorieta, presente no rodapé de cada fábula, não raro é mais carregada de moralismo do que de sabedoria. Muitas delas são debochadas e algumas me atingiram pessoalmente - como a de Diógenes, o filósofo cínico, que, ao ser ofendido por um careca, retruca: "Louvo seus cabelos, que abandonaram uma cabeça miserável". Difícil me defender. Mas voltemos às fábulas. Algumas se mantêm em voga, como a da raposa e as uvas, célebre em exibir como as pessoas desprezam o que não conseguem alcançar. Outras, mais que contemporâneas, parecem estar nas manchetes, como "O menino ladrão e sua mãe", onde um garoto, que desde guri roubava e cujo produto do roubo era comemorado pela mãe, depois de rapaz é preso e sentenciado à morte; seu último desejo, então, foi contar um segredo no ouvido da genitora, momento do qual se aproveitou para arrancar a orelha materna às dentadas. Disse ele à descuidada: "Se tivesse me punido no primeiro roubo, agora não me matariam." Pois é, diria meu tio Werther - que sabia como ninguém fazer caber todo um comentário dentro de um prosaico "pois é". Pois é. Mas, voltando ao tema, quantos peixes pequenos da nossa política, mofando na cadeia, não gostariam de fazer o mesmo aos seus papais tubarões, que nadam faceiros em mares de esgoto? Noutra, Esopo, cabotino, faz troça de si mesmo, ao dizer que o orador Dêmades, que falava ao vento, só recebia atenção popular ao convocar os passantes para uma fábula esópica. São mesmo peculiares. Uma das minhas prediletas é "A tartaruga e a águia", onde a tartaruga convenceu a águia a, mediante pagamento, ensiná-la a voar (embora a águia reiterasse que o intento era impossível). No dia da aula prática, depois das teóricas, a águia levou a tartaruga para o alto e soltou-a, depois do que a cascuda espatifou-se no chão. Ora pois. Em um mundo onde os burros são cada vez mais numerosos e confiantes, o alerta é bem vindo, ainda que os tais, por burros, não o ouçam. Mas há ainda a tartaruga sensata, caso da que venceu a corrida com a lebre, estorieta que ganhou o mundo - e que, como as demais, também era de Esopo. Tem as também politicamente incorretas, como "Zeus e a Vergonha", sobre os "prostitutos", que, grotesca e escatológica, não vou repetir aqui; quem quiser que a procure. E, para minha surpresa, eu que de Momo não sabia nada, descobri que ele havia sido enxotado do Olimpo por Zeus, dado às suas sugestões imbecis. É uma coletânea de exceção, farta de estórias tolas e sem sentido, mas com algumas que tornam a leitura pitoresca e bem-humorada. Eu gostei. Mas não vou encher a bola do milenarmente festejado Esopo. Não falta quem o faça.

CosacNaify, 562 páginas

Sidney Puterman

Some say he’s half man half fish, others say he’s more of a seventy/thirty split. Either way he’s a fishy bastard.

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