"No Surrender", por Hiroo Onoda

domingo, dezembro 16, 2012 Sidney Puterman


Eu era guri. A notícia no jornal me deixou pasmo: “Encontrado soldado japonês em ilha do Pacífico que achava que Segunda Guerra Mundial não tinha terminado.” O guerreiro não soube que a guerra acabou e continuou lá, entocado – por 30 anos! Menino, achei inadmissível. Me doeu. Queria saber mais; não consegui (era um tempo em que não existiam computadores, muito menos google na internet… estávamos em 1974). A história do japa que não se rendeu, entretanto, nunca saiu da minha cabeça. Sofria, imaginando suas três décadas desperdiçadas. Esqueci. Quando, recentemente, dei de cara na web com um livro trazendo seu relato, encomendei de pronto, mesmo não tendo sido traduzido para o português. Por sorte, o idioma não foi obstáculo; o maior empecilho foi mesmo a inabalável monotonia do texto, sem timing, recheado de descrições banais. Nem isso me afastou da leitura. Acompanhei o cotidiano e o exótico (para nós) raciocínio patriótico do tenente Onoda. Vivendo como selvagem em uma ilha inimiga, para onde foi organizar guerrilhas já no último ano do conflito, Onoda desenvolveu um inacreditável sistema de sobrevivência, ao lado de três outros compatriotas que, pouco a pouco, o abandonaram – por morte ou deserção. Empreendendo uma guerra solitária contra todos os nativos filipinos, confiante na vitória japonesa, o soldado rechaçou todas as tentativas de aproximação lançadas por seu país, que a certa altura soube da sua resistência. Teimoso, Onoda conduz o leitor às raias da irritação, ao interpretar a seu modo todos os indícios de que a guerra havia acabado, levando-o sempre à conclusão de que tudo ao redor (até mesmo as notícias transmitidas pelo rádio que encontrou) era sempre parte de uma insidiosa armadilha americana. Deixando de lado as imperfeições da obra e nos concentrando no personagem singular que era o obstinado tenente, conhecemos uma história ímpar, levada a cabo por um sujeito único. Leal, comprometido e corajoso – além de maluco, burro e inamovível -,  Hiroo Onoda já era, na minha remota infância, um homem pertencente a um passado anterior, lendário, que já há muito não existia. Agora percebo que o caráter desse tenente japonês pertencia, de fato, às lendas de séculos distantes. Doido e bravo Onoda.

Bluejacket Books,  219 páginas

Sidney Puterman

Some say he’s half man half fish, others say he’s more of a seventy/thirty split. Either way he’s a fishy bastard.

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